segunda-feira, 3 de setembro de 2012

O VÔO DA BORBOLETA


Agora, um poquinho de literatura para vocês!


O VÔO DA BORBOLETA


         As cinzas ainda espiralavam das chamas que a brisa fraca soprava do leste. O sol, tão impiedoso quanto o ato que destruiu aquele lugar, baixava no horizonte, como se também estivesse banhado de sangue, igual a terra sob os pés da garota. A única sobrevivente.
         Que poder ela possuía para que tivesse escapado?
         Pequenas lágrimas desciam pelo seu rosto sujo de fuligem, enquanto os olhos observavam o vôo da borboleta. Uma mancha de cores entre as plantas secas que rodeavam a paisagem local.
         Havia três dias que ela nada comia. Bebera água com dificuldade, em um poço artesanal que fora abandonado tempos atrás. Sua roupa rasgada e imunda balançava junto com seus cabelos negros. A sua frente à estrada estava desimpedida e aguardava sua decisão de segui-la. Não havia mais nada para ela ali. Durante estes três dias, procurou incansavelmente por vida entre os escombros. Nada.
         Desejou profundamente ser uma borboleta e ter asas ao invés de sentimentos. Assim, poderia fugir para bem longe daquele lugar e das lembranças que assomavam em sua memória a todo momento.
         Eliza, como se chamava a garota, tenta se aproximar da borboleta, mas esta não estava ali apreciando a seca e a morte, apenas fugia em busca de campos floridos onde pudesse viver. Com passos lentos e desajeitados, Eliza segue o vôo da borboleta sem saber por que faz isso. Quando o sol já estava em seu último ato, ela chega à beira de um abismo. “É fácil, basta imaginar as asas” – sussurra-lhe uma voz que ela imagina ser da borboleta. Se lançar-se dali, poderia partir para uma outra vida, ou para a escuridão eterna.
         Quem ela poderia vingar? Quem ela poderia culpar pelo incêndio devastador que queimara tudo e todos que conhecia? Se um dia houvera um culpado, este estava junto aos outros, morto.
         A borboleta parece entender os pensamentos de Eliza e pousa em seu ombro. Nesta terra, acredita-se que isto signifique sinal de boa sorte. A garota tenta toca-la. Está tão fraca e ferida que não consegue erguer a mão. Tinha vertigens e seus joelhos teimavam em curvar-se. Ela que fora bondosa e valente em toda sua curta vida, podia render-se agora.
         Sem qualquer aviso, ou som, a borboleta bateu suas asas e voou na imensidão escura que se abria a sua frente. Eliza que desejara com toda sua alma ser uma borboleta flutuava agora para um reino distante, onde não havia medo, morte ou dor.



Michelli Mortari. 

Todos os créditos para a autora.

5 comentários:

  1. Tenho a impressão de que foi a menina quem incendiou o lugar. O choque do arrependimento, fez com que Eliza procurasse por algum sobrevivente, mesmo que em vão.
    Lindo conto Mii! Parabéns ^^

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  2. Essa é uma das formas de interpretar! E por isso é que contos são extremamente belos...

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  3. amei amiga, muito cativante, parabéns.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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